terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Considerações sobre multas no cancelamento de passagens aéreas



O vigente Código Civil Brasileiro, no art. 740, diz que “O passageiro tem direito a rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada.”

Ao caput do referido artigo, acrescentam-se os seguintes parágrafos:

§ 1º. Ao passageiro é facultado desistir do transporte, mesmo depois de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor correspondente ao trecho não utilizado, desde que provado que outra pessoa haja sido transportada em seu lugar.


§ 2º. Não terá direito ao reembolso do valor da passagem o usuário que deixar de embarcar, salvo se provado que outra pessoa foi transportada em seu lugar, caso em que lhe será restituído o valor do bilhete não utilizado.

§ 3o Nas hipóteses previstas neste artigo, o transportador terá direito de reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro, a título de multa compensatória.

Entretanto, os valores cobrados pelas companhias podem variar em função das diferentes classes tarifárias oferecidas pelas empresas. Vigora atualmente a Portaria da ANAC n° 676 de 2000, que limita a taxa cobrada para reembolso em 10% do saldo a ser devolvido ao cliente, para voos nacionais. No entanto, a normativa permite que os bilhetes adquiridos mediante tarifa promocional tenham regras específicas para cancelamento e reembolso.

Atualmente, as taxas para cancelar e remarcar uma passagem aérea comprada em tarifas promocionais giram em torno de R$ 100,00. Em caso de pedido de reembolso, o passageiro deve ainda pagar uma taxa que varia de 40% a 50% do valor que sobrou após pagar a taxa de cancelamento.

Recentemente, uma decisão judicial oriunda do Estado do Pará, que obrigava as companhias aéreas TAM, Gol, Cruiser, TAF e Total a obedecer ao art. 740 do CC, cobrando as taxas máximas de 5% ou 10% do valor da passagem para remarcação ou cancelamento de voos, foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), de Brasília.

Todavia, existem alguns argumentos que podem ser levados à apreciação do Poder Judiciário contra as multas elevadas, que, às vezes, correspondem ao valor da passagem ou até mais, colocando o consumidor em flagrante desvantagem.

Um dos argumentos é o art. 49 do CDC, na hipótese da compra ter sido feita via internet. Diz assim o artigo:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

Há os que defendem que tal regra não se aplica à compra de passagens aéreas e dão suas razões. Entretanto, algum tempo atrás a 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal negou provimento a recurso de uma agência de viagens e manteve a sentença do Juizado Especial que afirma haver possibilidade de cancelamento de compra de passagem aérea sem multa pelo cliente, quando ocorre no prazo de sete dias a contar da assinatura do contrato ou do ato de recebimento do produto ou serviço.

De acordo com a sentença do Juizado Especial, as partes realizaram negócio jurídico de compra e venda de passagens aéreas. O autor requereu a não aplicação da pena de multa pela desistência da compra das passagens. O juiz decidiu que a agência de viagens não comprovou ter fornecido ao autor todas as informações necessárias em caso de desistência da compra. O magistrado afirmou ser indevida a referida cobrança, pois a empresa não comprovou ter prestado informação de forma clara e precisa ao consumidor.

O relator na Turma Recursal reitera que “A faculdade de desistir das compras fora do estabelecimento levam em consideração a maior vulnerabilidade do consumidor. Por isso foi estabelecida a regra do art. 49 do CDC, no sentido de que: o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio. No caso das compras por intermédio da internet, que também se dão fora do estabelecimento do fornecedor, há instrumentos de indução que se opõem à reflexão. Por isso não há razão de direito para excluir as compras realizadas por internet da incidência da norma referida, e nem é, o fato de a compra ser de passagem aérea ou de pacote turístico, motivo para um tratamento diferenciado. Assim, o direito de arrependimento há de se aplicar também aos contratos de compra de passagem aérea concluídos pela internet”.

O segundo argumento é do art. 39, inciso V:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

Ora, uma multa que extrapola o valor do contrato, é claramente abusiva, pois exige do consumidor vantagem manifestamente excessiva, caracterizando prática ilegal nos termos do artigo citado.

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