sexta-feira, 1 de julho de 2016

Consulta Fiscal Sefaz Piauí - Principio da Anterioridade

Excelentíssimo Senhor Secretário da Fazenda do Estado do Piauí
  
CONSULTA FISCAL
SOCIEDADE LTDA, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob nº 99.999.999/0001-99, inscrição estadual nº 999999, estabelecida na Av. Maranhão, 99, Tabuleta, CEP 64018-315, Teresina, PI, vem, por seu representante legal infrafirmado, fazer a presente CONSULTA FISCAL, para o que expõe a questão na forma a seguir.  
           A consulente exerce o comércio atacadista de papéis, papelões, etc, CNAE 9999-99, adquirindo estas mercadorias nas regiões produtoras e distribuindo-as no Estado do Piauí.

            Para efeitos de recolhimento de ICMS, a consulente está enquadrada no Regime Especial do art. 813-C do Decreto 13.500/2008 (RICMS/PI), que, dizia, antes das alterações introduzidas pelo Decreto nº 16.369, de 28/12/15:

Art. 813-C. O contribuinte devidamente credenciado deverá recolher o ICMS, tendo por base as saídas das mercadorias, observado o disposto no art. 813-F, mediante aplicação do multiplicador direto de:
I – 2% (dois por cento) sobre o valor total das mercadorias normalmente tributadas com alíquota interna inferior a 25% (vinte e cinco por cento), adquiridas em operação interna ou interestadual;
II – 5% (cinco por cento) sobre o valor total das mercadorias normalmente tributadas com alíquota interna igual ou superior a 25% (vinte e cinco por cento), adquiridas em operação interna ou interestadual.
§ 1º Além do recolhimento de que tratam os incisos I e II deste artigo, o contribuinte atacadista credenciado nos termos deste Capítulo, que realizar saídas a consumidor final não inscrito e aos operadores da economia informal, deverá identificar o adquirente consumidor final mediante indicação do CPF ou do CNPJ na Nota Fiscal de Consumidor Eletrônica – NFC-e, no Cupom Fiscal ou na Nota Fiscal de Venda a Consumidor, modelo 2, nas compras será exigida a retenção e o recolhimento do ICMS na fonte, pelas operações subsequentes, conforme art. 1.140 e inciso I do art. 1.142, correspondente à aplicação do multiplicador direto de 3,4% (três inteiros e quatro décimos por cento) sobre o total das referidas saídas, devendo o valor da operação ser lançado na DIEF, campo “Substituição Tributária.
Desse modo, a requerente apurava e recolhia o ICMS na forma preconizada no artigo supra transcrito e seus incisos I e II e parágrafo primeiro.
Em 28/12/2015, todavia, foi publicado o Decreto nº 13.369, o qual, dentre outros comandos, modificou os inciso I e II, do artigo 813-C, e inclui o inciso II. Com as alterações, a redação do artigo no qual se baseia a apuração do ICMS da consulente passou a ser a seguinte:
Art. 813-C. O contribuinte devidamente credenciado deverá recolher o ICMS, tendo por base as saídas das mercadorias, observado o disposto no art. 813-F, mediante aplicação do multiplicador direto de:
I – 2% (dois por cento) sobre o valor total das mercadorias normalmente tributadas com alíquota interna inferior a 25% (vinte e cinco por cento), adquiridas em operação interna ou interestadual, nas saídas destinadas a contribuintes do ICMS;
II – 5% (cinco por cento) sobre o valor total das mercadorias normalmente tributadas com alíquota interna igual ou superior a 25% (vinte e cinco por cento), adquiridas em operação interna ou interestadual, nas saídas destinadas a contribuintes do ICMS.
III – 7% (sete por cento) sobre as operações de saídas destinadas a não contribuintes do ICMS, pessoas físicas ou jurídicas, e produtor rural, identificados por CPF ou CNPJ.
§ 1º Além do recolhimento de que tratam os incisos I, II e III deste artigo, o contribuinte atacadista credenciado nos termos deste Capítulo, que realizar vendas superiores a 40% do total de vendas para estabelecimentos de uma mesma empresa, fica sujeito ao recolhimento de adicional de ICMS correspondente a aplicação de 5% (cinco por cento) sobre o valor do faturamento que ultrapassar o limite máximo acima referido, excluídas as operações imunes, isentas, não tributadas e as tributadas em substituição tributária, sem dedução de quaisquer créditos.
Destarte, por força da alteração informada, os contribuintes enquadrados no regime especial do art. 813-C tiveram a carga tributária elevada de 5,4% para 7%.
Posta a situação, a dúvida que se pretende solucionada por Vossa Excelência é relacionada ao início da vigência dessa alteração; quer dizer, a partir de quando passa a ser obrigatória a alíquota de 7% em substituição aos 5,4% anteriores.
Entende a consulente que a alteração introduzida por Decreto de 28/12/2015 somente se aplica a partir de abril de 2016, posto que deve obediência ao principio da anterioridade (também nonagesimal) consagrado no artigo 150 da Constituição Federal:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;  (destacamos)
Entender de outra forma, quer dizer, dar vigência à alteração a partir de 01/01/2016, é contrariar o texto constitucional, o qual veda o elemento surpresa na majoração de tributos.
A Consulente é empresa organizada, e, especialmente na conjuntura atual, onde todos os passos devem ser milimetricamente previstos, sob pena de comprometer sua própria continuidade, procura ser fiel ao seu orçamento, mantendo o equilíbrio entre receitas e despesas.
Assim, caso a carga tributária pule abruptamente de 5,4% para 7%, de um dia para o outro, sem qualquer aviso prévio, ou seja, de surpresa, causa grande impacto no planejamento da empresa, a qual não teve tempo de analisar a consequência dessa elevação de tributos nos seus negócios, especialmente no preço final que deverá praticar em seus produtos.
Não permitir que a empresa sofra com aumento repentino da carga tributária é o intuito da limitação ao poder tributante contida na alínea “c”, inciso III do art. 150 da CF/1988.
Para o professor Hugo de Brito Machado (2012, p. 234), a revogação de isenção, o que podemos estender a um benefício, equivale a instituição de novo tributo, o que implica na necessidade de aplicação dos princípios da anterioridade e anualidade, já que estas situações acarretam o mesmo efeito prático:
A revogação de uma lei que concede isenção equivale à criação de tributo. Por isto deve ser observado o princípio da anterioridade da lei, assegurado pelo art. 159, III, “b”, da Constituição Federal. O STF, todavia, tem entendimento de modo diverso, decidindo que a revogação da isenção tem eficácia imediata, vale dizer, ocorrendo a revogação da isenção, o tributo pode ser cobrado no curso do mesmo exercício, sem ofensa ao referido princípio constitucional.[1]
O Excelso Supremo Tribunal Federal vinha adotando o entendimento de que a revogação de benefício fiscal não importava em aumento de tributo, sendo apenas parte da política econômica de cada ente público.
Todavia, tem caminhado, ultimamente, em sentido oposto, acolhendo os reclamos doutrinários, ao estabelecer que a revogação de benefício fiscal deve observar a anterioridade.
Destaca-se, nessa linha, o deferimento de Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.325/DF, que julgava lei complementar que postergou a utilização de créditos tributários até então permitidos.
E ainda o julgado recente em que foi relator o Ministro Marco Aurélio, mesmo enfrentando a oposição do seu colega Dias Toffoli:
IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS – DECRETOS Nº 39.596 E Nº 39.697, DE 1999, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – REVOGAÇÃO DE BENEFÍCIO FISCAL – PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE – DEVER DE OBSERVÂNCIA – PRECEDENTES. Promovido aumento indireto do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS por meio da revogação de benefício fiscal, surge o dever de observância ao princípio da anterioridade, geral e nonagesimal, constante das alíneas “b” e “c” do inciso III do artigo 150, da Carta. Precedente – Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.325/DF, de minha relatoria, julgada em 23 de setembro de 2004. MULTA – AGRAVO – ARTIGO 557, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Surgindo do exame do agravo o caráter manifestamente infundado, impõe-se a aplicação da multa prevista no § 2º do artigo 557 do Código de Processo Civil.[2]
Com espeque nestas considerações, resta claro que a revogação de um benefício, assim como uma isenção, deverá atender, a fim de acarretar maior segurança ao contribuinte, o princípio da anterioridade, já que, na essência, a norma que era isenta retoma para o campo de incidência, instituindo assim uma nova obrigação tributária para o contribuinte então isento.
Em síntese, entende a Consulente, que as alterações trazidas pelo Decreto nº 13.369, de 28/12/2015, que causaram aumento na carga tributária dos atacadistas tributados na forma do art. 813-C, devem obedecer à noventena (anterioridade ou nonagesimal), produzindo efeitos, portanto, apenas a partir de abril de 2016.
Esse parece ser, também, o entendimento desta Sefaz, posto que a versão do sistema DIEF, contemplando referida alteração somente foi disponibilizada em 19/05/2016, ou seja, para declarar as informações relativas ao mês de abril. Até o mês anterior (março/2016) vigia a versão antiga.
Face ao exposto, solicita solução, requerendo que o Consultor solucione a questão tecendo outros comentários que achar relevantes.
Declara, para fins do disposto no inciso I, e suas alíneas, II, III e IV, do art. 1.556 do RICMS/PI, que não se encontra sob ação fiscal iniciada, já instaurada ou concluída para apurar fatos que se relacionem com a matéria objeto da presente consulta, não foi notificada nem está intimada a cumprir obrigação relativa ao fato e que este não foi objeto de decisão anterior, ainda não modificada, proferida em consulta ou litígio em que tenha sido parte a consulente.
Face ao exposto, solicita solução, requerendo que o Consultor solucione a questão tecendo outros comentários que achar relevantes.
Nestes Termos
Pede Deferimento,
Teresina, PI, 30 de junho de 2016
REPRESENTANTE LEGAL



[1] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 33 ed. São Paulo: Malheiros, 2012.
[2] AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 564.225 RIO GRANDE DO SUL

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