sexta-feira, 26 de agosto de 2016

A Previdência Privada não pode ser penhorada para quitar dívida trabalhista


Um dos grandes problemas para os que arriscam investir em negócios próprios no Brasil é a possibilidade de ver seus bens particulares bloqueados, penhorados e levados à hasta pública (leilão) em caso de fracasso do negócio que criaram.
Ainda que optem por trabalhar com natureza jurídica de sociedade limitada, sociedade anônima ou eireli, onde o patrimônio da empresa é distinto do dos seus sócios, o risco de responder pessoalmente (com seus próprios bens) pela bancarrota do empreendimento existe e não é muito raro ocorrer especialmente em momentos de crise, quando o que mais se vê são negócios fechando as portas com dívidas pendentes.

Um tipo de obrigação campeã em pegar os bens dos sócios é o crédito trabalhista.
É muito comum na Justiça do Trabalho a situação em que a empresa não pôde cumprir no todo com suas obrigações perante o empregado: às vezes ficou devendo algumas horas extras, uns avos de férias, ou alguns depósitos de FGTS, coisas mínimas até, mas que são direitos do empregado, de modo que ele obtém sentença declarando seu direito de receber o valor devido.
Ocorre que não estando mais a empresa em funcionamento, facilmente a responsabilidade de saldar a dívida é transferida para seus sócios, pela aplicação do fenômeno denominado desconsideração da personalidade jurídica, sendo os sócios solidários para a quitação do débito.
Em sendo aplicada essa medida, decisão que cabe ao juiz do feito, o empregado pode apontar bens dos sócios para serem penhorados visando saldar a dívida.
Um dos meios mais fáceis de encontrar bens dos sócios é o sistema Bacenjud, que os juízes utilizam para encontrar valores que a pessoa detenha em qualquer instituição financeira do país.
Dessa forma, ao solicitar o bloqueio de saldos em banco, tudo que estiver em nome da pessoa consultada está passível de ser atingido pela medida, inclusive contas salários, cabendo ao prejudicado requerer ao juiz a liberação daquilo que seja legalmente impenhorável.  
Recentemente, entretanto, o TST decidiu que a penhora não pode recair sobre valores que os sócios de empresa executada tenham em planos de previdência privada.
No RO-7237-58.2014.5.15.0000 o Tribunal Superior do Trabalho manteve a impenhorabilidade dos valores da previdência privada de um ex-sócio de uma companhia aérea bloqueados por determinação do juízo da 11ª Vara do Trabalho de Campinas, SP.
Como a quantia serve principalmente à futura aposentadoria e seus proventos, em regra, não podem ser penhorados, os ministros entenderam que a proteção se estende à previdência complementar.
O juiz do caso havia desconsiderado a personalidade jurídica da empresa e ordenado a duas seguradoras a transferência de R$ 254 mil do plano de previdência privada mantido pelo empresário. Para o juízo de primeiro grau, tais verbas são penhoráveis porque se trata de investimento que pode ser sacado a qualquer momento.
O TRT da 15ª Região, deferindo mandado de segurança do empresário, mandou desbloquear os valores, entendendo que o artigo 649, inciso IV, do Código de Processo Civil de 1973 garante a impenhorabilidade de salários, subsídios, soldos e proventos de aposentadoria, salvo para pagamento de prestação alimentícia. Segundo o TRT-15, as verbas trabalhistas não se enquadram na exceção, que comporta somente as relações de parentesco entre o credor e o devedor.
Inconformado, o empregado apelou à última instância laboral, argumentando que a quantia é passível bloqueio porque o antigo sócio da companhia aérea não é aposentado.
No TST, o Min. Vieira de Melo Filho desatendeu o pedido do empregado, esclarecendo que não há como confundir ou equiparar os planos de previdência complementar voltados à aposentadoria com as aplicações financeiras comuns.
De acordo com Vieira de Mello Filho, o ato do juiz de primeiro grau ofendeu o direito líquido e certo do empresário previsto no artigo 649, inciso IV, do CPC de 1973. "A partir de uma interpretação sistemática do dispositivo, a impenhorabilidade dos proventos de aposentadoria se estende ao plano de previdência privada, verba que também possui nítido caráter alimentar", concluiu.
O relator também disse que o acórdão do TRT-15 está em conformidade com a Orientação Jurisprudencial 153 da SDI-2, que reconhece a ofensa a direito líquido e certo quando há bloqueio de quantia existente em conta salário, para quitar dívida trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a quantia revertida para fundo de aplicação ou poupança.  

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