Para
a realização de vendas a empresa utiliza os serviços representantes comerciais
(sociedades empresárias limitadas) e de vendedores registrados como empregados.
A
empresa tem a intenção de contratar para essas atividades Promotores de Vendas Independentes,
cadastrados na Receita Federal como MEI (CNAE 7319-0/02).
Indica que as atividades desses profissionais seriam, dentre outras,
demonstrar produtos, apresentar material publicitário ao cliente, afixar
cartazes publicitários na loja do cliente, organizar mercadorias em gôndolas,
instalar e treinar o software da empresa em que os clientes podem fazer seus
pedidos, auxiliar a digitar pedidos,
fazer digitação de pedidos.
O Microempreendedor
Individual (MEI) foi criado no Brasil como uma maneira de os trabalhadores
informais passarem à legalidade, sendo alcançados pelos benefícios
previdenciários que antes não possuíam, mediante o pagamento de uma
contribuição mensal reduzida.
O MEI é uma
pessoa física, inscrita no CNPJ, que trabalha por sua própria conta, qualificado
como pequeno empresário, podendo faturar até R$ 81 mil por ano. Não pode ter participação
em outra empresa como sócio, administrador ou titular e pode ter no máximo um
empregado registrado com um salário mínimo ou o piso da categoria.
As atividades
permitidas ao MEI são aquelas informados no Anexo XIII do Simples Nacional.
Pois bem, dentre as atividades permitidas ao MEI
está a de Promotor de Vendas, mas não está a de Representante Comercial.
Dessa maneira, a conclusão é que a empresa pode
contratar um MEI como Promotor de Vendas, mas não pode contratar como
Representante Comercial. Também, entendo que, no tocante à atividade a ser
desenvolvida, o MEI pode realizar todas as tarefas elencadas no parágrafo
acima, inclusive fazer vendas utilizando o tablet da empresa.
Mas a grande questão é se a contratação de pessoa
inscrita como MEI para Promotor de Vendas não terminará por criar um vínculo de
emprego entre a o contratado e a empresa contratante.
Para fazer essa análise convém verificar quais
requisitos configuram uma relação de emprego. São eles:
Pessoalidade: o trabalho é feito por uma
pessoa específica, que não pode se fazer substituir no desempenho da tarefa;
Não eventualidade: o trabalho é prestado de
forma permanente. Se a pessoa trabalha mais do três vezes por semana, por
exemplo, já caracteriza uma relação de emprego.
Onerosidade: o trabalhador recebe um
salário como contraprestação pelo serviço.
Subordinação: o trabalhador está
subordinado a um chefe da empresa contratante, que pode ser um coordenador, gerente...
Quer dizer, quando o serviço for
prestado por um MEI, de forma habitual, com dedicação exclusiva, recebendo
constantes instruções e cobranças da empresa, que exerce controle sobre suas
atividades, já pode sim gerar vínculo empregatício.
Caso sejam comprovadas essas
características, a contratação do MEI poderá ser classificada como tentativa de
burlar a legislação trabalhista, situação em que a empresa contratante deverá
pagar todas as verbas trabalhistas devidas em uma relação de emprego.
Maior será o risco se o contratado como
MEI for alguém saído de uma relação de emprego com a empresa, que recebe valor
próximo ao que recebia sendo empregado, e que continua trabalhando
exclusivamente para a mesma empresa, e fazendo as mesmas atividades que antes.
Esse risco também haverá se o contrato
for com empresa individual não MEI, ou mesmo com sociedade limitada, se
mantidas as mesmas condições que citamos acima.
A única forma de contratação que
elimina qualquer risco é a contratação de vendedores no regime CLT, pagando-lhes
salário fixo e todas as comissões em folha.
Umas das características que se atribui ao MEI é o caráter
temporário da sua contratação. Exemplo: a empresa precisa fazer uma reforma, então
ela contrata um pedreiro cadastrado como MEI. Esse serviço tem prazo para
começar e para terminar. Mas uma empresa de construção civil não poderá contratar
um pedreiro MEI para ficar à sua disposição e prestar serviço em qualquer de
suas obras por prazo indeterminado.
A Resolução nº 140, do CGSN, diz que:
Art. 112. O MEI não poderá realizar cessão ou
locação de mão de obra, sob pena de exclusão do Simples Nacional. (Lei
Complementar nº 123, de 2006, art. 2º, inciso I e § 6º; art. 17, XII; art.
18-B)
§ 1º Para os fins desta Resolução, considera-se
cessão ou locação de mão de obra a colocação à disposição da empresa
contratante, em suas dependências ou nas de terceiros, de trabalhadores,
inclusive o MEI, para realização de serviços contínuos, relacionados ou não com
sua atividade fim, independentemente da natureza e da forma de contratação.
(Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 2º, inciso I e § 6º; Lei nº 8.212, de
1991, art. 31, § 3º)
§ 2º As dependências de terceiros a que se refere o
§ 1º são as indicadas pela empresa contratante, que não sejam as suas próprias
e que não pertençam ao MEI prestador dos serviços. (Lei Complementar nº 123, de
2006, art. 2º, inciso I e § 6º)
§ 3º Os serviços contínuos a que se refere o § 1º
são os que constituem necessidade permanente da contratante, que se repetem
periódica ou sistematicamente, ligados ou não a sua atividade fim, ainda que
sua execução seja realizada de forma intermitente ou por trabalhadores
contratados sob diferentes vínculos. (Lei Complementar nº 123, de 2006, art.
2º, inciso I e § 6º)
§ 4º Considera-se colocação de trabalhadores,
inclusive o MEI, à disposição da empresa contratante a cessão do trabalhador,
em caráter não eventual, respeitados os limites do contrato. (Lei Complementar
nº 123, de 2006, art. 2º, inciso I e § 6º)
Entendo que o MEI será considerado como
cessão de mão de obra e descaracterizado como MEI, gerando assim um vínculo de emprego,
quando a prestação do serviço ocorrer na própria empresa contratante ou nas dependências
de terceiros. Se o MEI trabalha em seu próprio endereço, a proibição de prestar
serviços contínuos não ocorre.
Sabe-se que existe muito temor por
parte das empresas com o fato da contratação de prestador de serviço como MEI ou
outra forma de pessoa jurídica ser considerada “pejotização”, termo que
identifica a tentativa de precarização das relações de trabalho, burlando leis
trabalhistas. Todavia, nem toda contratação de PJ é uma “pejotização”.
O mais importante é que que na
relação entre contratante e contratado não estejam presentes os elementos que
caracterizam o vínculo de emprego.
Algumas decisões relacionadas ao
assunto:
EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO. PESSOA JURÍDICA. PEJOTIZAÇÃO. O
manto da pessoa jurídica é afastado quando constatados os elementos
fático-jurídicos da relação de emprego, prevalecendo, no direito do trabalho, o
princípio da primazia da realidade sob a forma (art. 9º da CLT).TRT da 3.ª
Região; Processo: 0002060-63.2013.5.03.0136 RO; Data de Publicação: 06/12/2016;
Disponibilização: 05/12/2016, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Pág. 395; Órgão Julgador: 8ª
Turma; Relator: Ana Maria Amorim Rebouças; Revisor: Convocada Ana Maria Espi
Cavalcanti)
EMENTA. FENÔMENO
DENOMINADO "PEJOTIZAÇÃO". TERCEIRIZAÇÃO DE ATIVIDADE-FIM. O
fenômeno denominado "pejotização" constitui modalidade de
precarização das relações de trabalho por intermédio da qual o empregado é
compelido ou mesmo estimulado a formar pessoa jurídica, não raras vezes
mediante a constituição de sociedade com familiares, e presta os serviços
contratados, mas com inteira dependência, inclusive econômica, e controle
atribuídos ao tomador. Tal prática vem sendo declarada ilegal pela Justiça do
Trabalho, quando comprovado o intuito de fraudar a aplicação da lei
trabalhista, em clara afronta ao disposto no artigo 9º da CLT, diante da
inteira e completa subordinação com o suposto contratante, situação
incompatível com o próprio conceito de empresa e em clara afronta aos
princípios protetivos clássicos do Direito do Trabalho. (...) Agravo de
instrumento a que se nega provimento. (...)." (AIRR
55300-23.2008.5.22.0003, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT
17/11/2017).
ACÓRDÃO. TRT 17ª Região -
0001337-90.2017.5.17.0014 (RO). RECORRENTE: ALEXANDER DA SILVA. RECORRIDO: COMERCIAL
LENA LTDA - ME, MARCIO ADRIANO DA COSTA SANTOS, IRENE DA COSTA SANTOS,
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPIRITO SANTO. RELATORA: DESEMBARGADORA CLAUDIA
CARDOSO DE SOUZA.
EMENTA. VÍNCULO DE
EMPREGO. NÃO COMPROVADO. PEJOTIZAÇÃO. NÃO CARACTERIZADA. Ausente a
comprovação nos autos de que o profissional tenha sido coagido a constituir a
pessoa jurídica com o escopo de atuação no mercado e permanência no emprego,
reputa-se não configurado o fenômeno da "pejotização", mormente
quando não demonstrados os elementos cumulativos para a caracterização do
vínculo de emprego, a saber: trabalho prestado por pessoa física com
pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica (arts. 2º
e 3º da CLT).
Destarte, caso
a empresa queira agir de forma arrojada poderá contratar MEI para atuar como promotor
de vendas independente, podendo estes, inclusive, realizar vendas digitando-as
em equipamento fornecido pela empresa. Como essa não é uma forma de atuação
ainda muito comum, é possível que algum desses trabalhadores venha a fazer reclamações
trabalhistas no futuro. Argumentos de defesa termos muitos, mas não se pode
garantir que nenhum juiz verá nessa forma de contratação o viés empregatício.
Do contrário,
se a empresa prefere um comportamento conservador, livre de qualquer
possibilidade de questionamento judicial, ainda que ela possa ter razão, essa
forma de contratação ainda não é recomendável.
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